quinta-feira, 23 de abril de 2009

"Castigo" a um corpo de mulher...

Vivemos o prazer de um corpo perfeito com a alegria de quem se vê bonito...de quem se ama a si mesmo e deseja que os outros vejam nele a representação física do tão desejado. Lembramos diariamente ao nosso corpo as imperfeições que gostaríamos que não existissem. Desdobramo-nos milhares de vezes com a finalidade de retardar o inevitável. Todos envelhecemos. Todos sofreremos as retaliações consequentes do decorrer da idade. Todos morreremos um dia porém, na incerteza do quando(?) não programado. Mas quem somos nós para comandar o nosso corpo? Como lhe explicamos que não queremos o que ele nos dá? Como o fazemos ver que chega? Que basta do sofrimento que ele nos causa?... É o corpo que nos comanda! É ele que nos surpreende numa manhã com o diagnóstico de cancro. É ele, o responsável por vivermos uma vida mutilados pela dor, pelo sofrimento e sobretudo pelo descontentamento de continuarmos vivos embora aprisionados a um corpo que nos maltrata sem descanso. Não consegue parar…não sossega um instante perante a imensidão do acto de sofrer. Choramos incessantemente na esperança que o amanhã seja melhor e, que nada do que sofremos hoje nos magoe no futuro. Vivemos iludidos…e…ainda bem que assim o é! Ainda bem que não somos apenas um corpo, que temos consciência de que algo existe para além da materialidade. Ainda bem que mesmo apalpando as existentes cicatrizes daquilo que outrora haviam sido as “minhas mamas” conseguimos ter força para sorrir e desejar viver. Ainda bem que, embora com um “golpe” cirúrgico no couro cabeludo não deixo de me observar ao espelho e admirar o cabelo branco que hoje tenho. Foi a vida que o trouxe…não a injustiça do meu corpo. Ainda bem que continuo linda! Independentemente de todos os traçados que o meu corpo já desejou fazer, continuo eu…o verdadeiro eu da minha essência… Linda… Lutadora… Mulher… Mãe e acima de tudo VIVA…porque eu desejo viver e, embora farta, exausta e sem controle na demência sofredora que o meu corpo tanto busca, prefiro sorrir-lhe. Sorrir para continuar viva pois, o segredo para a felicidade não está no “corpo presente” mas sim no sentir verdadeiro que eu te mostro.

Na observação de uma beleza incomensurável registamos um insignificante rasto do sofrimento que um “estúpido” corpo nos causou.

(O "desabafo" que vos deixo não é de todo uma chamada de atenção para o problema nem tem o objectivo de dramatizar ou "puxar para baixo" quem vive a situação de um cancro. É um apelo aos sentimentos de felicidade e ao gosto pela vida, funcionando como agradecimento especial a todas as pessoas que já passaram por situações duras como esta e vivem transparecendo sorrisos que nos ensinam verdadeiras lições de luta, dedicação e perseverança face às injustiças que muitas das vezes condicionam a continuidade da nossa vida. Sem necessidade de referir nomes pois, isso cabe aos inseguros, o apelo à escrita deste texto deve-se a uma senhora que conheço muito pouco, quase nada mesmo, mas que pelas vivências que tive sempre se mostrou uma Mulher de armas. A ela, o meu Muito Obrigado pela “chapada” de luva branca que me dá sempre que me queixo de algo ou desanimo perante alguma situação menos boa.)

2 comentários:

Daniel C.da Silva disse...

Muito bom e merecida homenagem.

Abraços

Fábio Savelha disse...

Obrigado pelo coment,
Volta sempre.

Fábio